Dia da Consciência Negra.Até quando esses versos de Castro Alves vão continuar atuais?

Execução de Punição por Flagelo – Jean Baptiste Debret

Com trechos do poema Navio Negreiro, de Castro Alves, que integra o poema épico Os Escravos, os Estados Gerais da Cultura refletem sobre o Dia da Consciência Negra, num momento sombrio de retrocesso que o Brasil passa neste 20 de novembro de 2021. A potente interpretação na voz de Eduardo Tornaghi e a montagem de imagens e vídeo feita por Rubens Ragone nos envolvem nas rimas da poesia de Castro Alves, que foi a voz mais eloqüente e forte na defesa da raça negra e de sua libertação do cativeiro. Confiram o vídeo e leiam abaixo trechos da poesia em texto:

(…) Mas que vejo eu aí… Que quadro d’amarguras!
É canto funeral! … Que tétricas figuras! …
Que cena infame e vil… Meu Deus! Meu Deus! Que horror!

Era um sonho dantesco… o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros… estalar de açoite…
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar…

Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!

E ri-se a orquestra irônica, estridente…
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais …
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos… o chicote estala.
E voam mais e mais…

Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!

No entanto o capitão manda a manobra,
E após fitando o céu que se desdobra,
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
“Vibrai rijo o chicote, marinheiros!
Fazei-os mais dançar!…”

E ri-se a orquestra irônica, estridente. . .
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais…
Qual um sonho dantesco as sombras voam!…
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!…

Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura… se é verdade
Tanto horror perante os céus?! (…)

(…) Existe um povo que a bandeira empresta
P’ra cobrir tanta infâmia e cobardia!…
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!…
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio. Musa… chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto! …

Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança…
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!…(…)

14 de março: alegrias e lamentos. Glauber Rocha presente!

Chico Mário, Glauber Rocha, Castro Alves, imagens via internet

Hoje é um dia de muitas emoções. Muitas homenagens. Alegrias e lamentos!

Lamentamos profundamente o assassinato da Marielle que nos dá este sorriso, com qual abrimos esse encontro, mas até agora os mandantes do seu assassinato estranhamente não foram encontrados. Continuamos lutando por justiça para Marilelle, justiça para Anderson e que logo uma investigação verdadeira, aprofundada, encontre e puna os seus assassinos.

Estamos abrindo esse encontro com essa homenagem. Hoje também é dia de homenagear os nascimentos de Glauber Rocha e Castro Alves, que nasceram neste 14 de março. Ambos, um poeta com imagens, Glauber, Castro Alves com palavras. Glauber sempre disse que morreria com a mesma idade que Castro Alves. Glauber morreu com 42 anos e Alves com 24 anos.

Homenageamos também o músico Chico Mário que morreu há 32 anos, irmão do Henfil, do Betinho. O Chico Mário era um virtuoso da música, um compositor maravilhoso, um batalhador pela música independente . Ele que inventou a ‘vaquinha’ para compor e editar as músicas, livres das gravadoras. Chico Mário abriu este caminho na arte, que aos 39 anos morreu da AIDS por conta da doença que ele tinha e pegou o vírus mortal por uma transfusão de sangue, num banco de sangue e estava contaminado.

Depois, graças ao SUS os bancos de sangue foram estatizados e graças ao batalhador incansável Sérgio Arouca, que lutou pela estatização do sangue e tirou daqueles vampiros que faziam do sangue um comércio. Graças essa ação do SUS e do Arouca muitas vidas foram salvas.

Hoje vivemos uma nova pandemia por conta desse descaso desse governo com a saúde da população. Estamos abrindo este encontro com estas manifestações de solidariedade aos aniversariantes, aos que morreram por conta desse descaso público.

Os Estados Gerais da Cultura que nasceram para ajudar a recriar o Ministério da Cultura saúda com muita alegria e emoção a demissão do genocida do Ministério da Saúde e exige a recriação do MinC, com a demissão daquele ator de quinta categoria que ocupa a Secretaria da Cultura, uma gaveta do Ministério do Turismo.

Precisamos de um Ministério de verdade para transformar a Cultura num grande encontro das artes, do teatro, da dança, do cinema, das artes plásticas, da música, de tudo e não esse arquipélago dilacerado por este governo irresponsável.

Então seguimos juntos! Temos também neste encontro a Amanda, uma jovem estudante de teatro, que está sendo proibida de frequentar o curso na UniRio, por conta de um reitor bolsonorista que esta negando a matrícula. Ela passou no vestibular em primeiro lugar e seu direito a estudar não está sendo respeitado.

Texto: Silvio Tendler

Esta foi a fala de Silvio Tendler na abertura do encontro que contou a presença de três agitadores culturais, Maurício, Cavi e Jota, para falar sobre as bibliotecas comunitárias.