Fogo no Museu

Siron Franco é um dos artistas mais importantes no cenário das artes plásticas do Brasil e também reconhecido internacionalmente. É pintor, escultor, ilustrador, desenhista, gravador e diretor de arte. Marcou em sua trajetória artística o testemunho de um tempo, sobretudo social e ambiental. Em 1974 foi considerado o melhor pintor nacional em sua participação na 12o. Bienal de São Paulo. No ano seguinte, com o prêmio viagem ao exterior, reside entre capitais européias e o Brasil.

Entre as obras que se destacam, a série Rua 57, sobre o acidente com Césio-137 em Goiânia na cidade onde nasceu, chama atenção para o maior acidente radioativo do país. Nesse trabalho ele reafirma o potencial da arte em registrar tragédias humanas e sociais. A série completa foi exposta na 33a. Bienal de São Paulo- 2018. Além das telas, Siron coloca em debate a importância dos médicos de Cuba em ações de amplo caráter social. “O paralelo entre Cuba e a obra de Siron é para refrescar a memória, para dar um ‘soco na boca do estômago’ de quem questiona a competência do sistema de saúde cubano”.  mais sobre o assunto em PanHoramarte.

O testemunho de Siron Franco na Rua 57 , nos remete a Cuba porque foram os médicos cubanos que trataram das pessoas atingidas pela radiação, considerando que era, na época, o único país no mundo a ter experiência em tratamentos adequados em casos de radiação. Quando ocorreu o vazamento de Chernobyl, na Russia, Cuba montou uma clínica próximo a Havana para atender mais de 3000 vítimas do acidente russo

O artista, hoje com 74 anos, acredita que a arte tem a finalidade de trazer dias melhores para o homem. Numa entrevista ao Itaú cultural ele afirmou : “eu tento, ao meu modo, testemunhar a minha época, o que faço é uma crônica subjetiva da época em que vivo”. Nesse aspecto vale lembrar que foi com o tema relacionado à tragédia do Césio-137 que enfrentou o maior desafio, o de pincelar algo que era invisível. “Quando lida com água, com o fogo, você vê o problema. Quando lida com o material radioativo não”. Fonte: Nexo.

Entre 1985 e 1987, faz direção de arte para documentários de televisão como Xingu, concebido por Washington Novaes, premiado com medalha de ouro no Festival Internacional de Televisão de Seul. Desde 1986, realiza monumentos públicos, baseados na realidade social do país. Entre 1992 e 1997, ilustra vários livros, como O Desafio do Branco, de Antonio Carlos OsórioO Forasteiro, de Walmir Ayala (1933-1991), e Contos que Valem uma Fábula: História de Animais Animados, de Katia Canton (1962), entre outros.

Culto aos Orixás: patrimônio imaterial brasileiro.

Os Estados Gerais da Cultura colocam em pauta a importância cultural e histórica das religiões de matriz africana. Culto aos Orixás é tema para uma boa prosa entre cinco convidados, sobretudo pelo viés do titulo: patrimônio imaterial do povo brasileiro, especialmente pelo destaque do sincretismo.

Luzia Cruz Pereira – Conhecida na Umbanda como Luzia de Iemanjá e no Candomblé com Luzia Omindewá ou só Omindewá. Aos 17 anos começou na Umbanda (hoje tem 63 anos) e em 1981 fez iniciação no Candomblé e daí por diante permaneceu por mais de 30 anos no Ilé de iyá Omindarewá até a morte dela. Em 1994 fundou o Centro de Umbanda, com conhecimento de Iyá. Em 18 de junho de 1994 nasce o Centro Espírita e Cultural Recanto de Oxalá, “aonde cultuo com todo Amor a minha Umbanda querida. Hoje tenho 40 anos de iniciada no Candomblé e 47 de Umbanda”.

Luiz Rufino – Professor da UERJ-FEBF (Faculdade de Educação da Baixada Fluminense) vinculado ao Departamento de Ciências e Fundamentos da Educação. Autor de 6 livros e dezenas de artigos sobre educação, crítica ao colonialismo, relações Étnico-raciais, culturas e filosofias populares brasileiras. Para saber mais sobre Luiz Rufino clique aqui

Professor Pós-Doutor Babalawô Ivanir dos Santos- É autor do livro “Marchar Não é Caminhar:  interfaces políticas e sociais das religiões de matriz africana no Rio de Janeiro”, atualmente é Pós-Douor em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGHC/UFRJ).  Pesquisador e coordenador de área de pesquisa no Laboratório de História das Experiências Religiosas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LHER/UFRJ). Membro da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN). Conselheiro Estratégia do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (CEAP).

Maria Cristina Mendes – Mãe Pequena do Terreiro Pai Maneco, do qual participa como médium desde 1992; além da participação nos trabalhos mediúnicos, atua na organização de publicações e na gravação de pontos cantados. Professora no Programa de Pós-Graduação CINEAV – FAP/ UNESPAR e do curso de Licenciatura em Artes Visuais – DEARTES/ UEPG. Tem Doutorado e Mestrado em Comunicação e Linguagens na UTP/ PR (2014 e 2010), Especialização em História da Arte do século XX (2000) e Graduação em Pintura na EMBAP/ PR (1984). É membra da SOCINE e da ANPAP. Participa dos seguintes grupos de pesquisa: Eikos: imagem e experiência estética; Educação, Trabalho e Sociedade; INTERART – Interação entre arte, ciência e educação. Desenvolve pesquisa em Adaptação cinematográfica, Poéticas Artísticas e Arte-Educação.

Lucilia Guimarães – É foto jornalista desde a década de 1970, atuando hoje na Comunicação Social da prefeitura de Curitiba. Em 1988 participou com seu pai, Fernando Guimarães, da criação do Terreiro Pai Maneco; foi cruzada Mãe de Santo em 1999 e desde 2012 é a dirigente espiritual do Terreiro. Participa de vários movimentos contra a intolerância religiosa, promove eventos culturais e criou o movimento “Bandeira da Amizade”, uma forma de aproximar e estabelecer laços entre as casas de Umbanda de Curtitba. Pesquisou a história da religião in loco, participando, na década de 1990, de trabalhos com D. Zulmeia e D. Zélia, filhas do criador da Umbanda, Zélio de Morais, promovendo uma história que é hoje repostada em vários sites de Terreiros. Por diversas vezes levou médiuns do Terreiro Pai Maneco para conhecer a Festa da Boa Morte, na cidade de Cachoeira, na Bahia, maior exemplo de sincretismo religioso do Brasil. É uma batalhadora da cultura dentro da religião, por acreditar que esta é a grande saída para levar o conhecimento sobre a Umbanda.

A Favela Resiste: Solidariedade e Luta nas Comunidades

A edição especial dos Estados Gerais da Cultura, coloca em pauta o urgente debate sobre a questão da extrema violência de Estado aplicada às comunidades das favelas e periferias, cujo exemplo foi a operação policial mais letal da história do Rio de Janeiro, que deixou 28 mortos, na quinta-feira do dia 6 de maio, na favela do Jacarezinho. O evento será protagonizado por lideranças ativas das favelas carioca.

Rumba Gabriel (Jacarezinho) é fundador do Portal Favelas e do Movimento Popular de Favelas, Compositor da Mangueira, jornalista, teólogo e formando em Direito. Jaime Muniz, Ativista Social e um dos Coordenadores do Movimento FAVELAÇÃO, mais Thiago Baia (Jacarezinho) é mestre Capoeira ativista de Favela Movimento favelação, Giselle Florentino (Maré) e Jaime Muniz (movimento Favelação).

Reflexión Breve sobre la situación actual Colombiana

Sebastian Calderon

La situación que vive el país Colombia, es una situación que es estructural al orden hegemónico que se ha venido dando. Una de las características históricas ha sido el silenciamiento de los que se “sublevan” como respuesta contra- revolucionaria de la derecha o elite, que busca el poder y conservarlo a como dé lugar.

Un síntoma de esto se sostiene por el aumento de ataques paramilitares en los días de manifestaciones más arduos, que llevaron a la muerte a estudiantes y a obreros del país, esto es lamentable, si se tiene en cuenta la incidencia de la sublevación en otros países latinoamericanos. ¿Qué hacer? Hay dos salidas, la republicana donde sigamos creyendo que la democracia debería ser justa, así como la toma del poder de una izquierda que no ha tenido el poder acá en Colombia, o dejamos el poder de parte del pueblo y su justa lucha desde los frentes que son más que necesarios hoy en lo micropolítico.

Así mismo, haciendo una reflexión personal, me di cuenta la influencia que tienen los ideólogos e intelectuales de la derecha en todos estos procesos, aunque no jalan el gatillo, son los que propician la contra-revolución, es triste ya que no solamente es una estrategia local, también se agencia en países como Brasil o en estados fallidos como Israel. La lucha sigue en las calles, donde es el terreno de encuentro con los otros y con la paz que tanto se anhela en estos tiempos.

Texto de Sebastian Calderon, Professor Universidad Pedagogica Nacional, em Bogota. 

Por que nós estamos sofrendo tanto? Por que nós estamos sendo massacrados?

Paulo Cannabrava

O presidente do México, López Obrador surpreendeu todo mundo, inclusive a mim. Com planilhas e quadros, Obrador denunciou que funcionários da embaixada dos Estados Unidos e agências dos Estados Unidos estão por trás dos principais movimentos de oposição, por trás das ONGs que financiam movimentos sociais. Umas das organizações “México Contra a Corrupção” recebeu 40 milhões de dólares, nesses últimos anos. Apenas nesse ano de 2021, recebeu 7 milhões de dólares. Eles pagam jornalistas que escrevem editoriais. Um salário pro jornalista ficar fazendo crítica e espalhando…

Hoje tá muito na moda espalhar boatos e mentiras pelas redes sociais. Manipular as redes custa caro. É uma das formas dos Estados Unidos trabalhar para desestabilizar qualquer governo progressista.

A Colômbia tem um general que participa do Comando Sul dos Estados Unidos, junto com um general brasileiro. A Colômbia tem 8 bases militares dos Estados Unidos no seu território. Tem tropas especiais dos Estados Unidos dentro do seu território. Treinando gente para, o que eles chamam, a “guerra anti-subversiva”. Mas, inclusive, a guerrilha não está mais lá.  “Ah, então estão treinando contra o narco tráfico”. O narco tráfico é deles.

Esse Duque é cria da família Uribe. O clã Uribe é que era o chefe supremo do Pablo Escobar, um operador da questão do tráfico. Mas por trás sempre tem um comando oligárquico. Você não faz uma ilicitude, principalmente no campo da droga, sem autorização de um banco e sem autorização da DEA, que é o departamento anti-droga dos Estados Unidos. Eles são sócios disso tudo.

A Colômbia é responsável hoje por 90% da cocaína consumida no mundo. Quantos porcentos dessa cocaína consumida no mundo é consumida nos Estados Unidos? Os Estados Unidos é o maior consumidor. Interessa para os Estados Unidos o controle disso porque são milhões de dólares que o tráfico gera.

Então quem está por trás dessa repressão violenta contra o povo irmão colombiano? A máfia judia, os neopentecostais sionistas, que estão atuando por baixo das relações exteriores de Israel. E evidentemente os organismos de inteligência dos Estados Unidos. A triste condição da Colômbia: é um país ocupado. Tropas pretorianas estão massacrando o seu povo à serviço do Império.

O Brasil hoje tá muito parecido com a Colômbia. Nós temos um governo de ocupação. São 9 mil militares. Em nenhum outro país do mundo existe isso. Uma ocupação militar. 9 mil militares ocupando todos os postos, nas mais diversas hierarquias do governo. À serviço de quem? À serviço dos Estados Unidos. E  temos também um general de Estado-Maior no Comando Sul dos Estados Unidos. A gente precisa saber quem a gente vai combater. Precisamos cortar o vínculo dos Estados Unidos com as nossas instituições. Como fez o Evo Morales. A primeira coisa que ele fez depois que ele assumiu foi expulsar os agentes da DEA e da CIA e dizer pra Embaixada: eu quero reciprocidade. O mesmo número de funcionários na Embaixada dos Estados Unidos aqui é o mesmo número de funcionários na Embaixada da Bolívia em Washington. Ele durou bastante tempo. Quase que anulou a conspiração. Mas eles começaram a trabalhar por baixo. E através dos neopentecostais ligados ao sionismo, agentes de inteligência de Israel e dos Estados Unidos, armaram aquele golpe.

A repressão é igual no Chile, na Bolívia, em toda parte. E aqui, igualzinho. Anteontem uma chacina, 28 executados num bairro chamado Jacarezinho, no Rio de Janeiro.

Quem é o inimigo? São as forças armadas porque estão vinculadas aos Estados Unidos. Os serviços de inteligência nosso estão manipulados pelo serviço de inteligência dos Estados Unidos. A gente tem que fazer com que a burguesia entenda que sem soberania nacional não existe país.

Ideias de Paulo Cannabrava colocadas no encontro Nos están Matando. Que o mundo saiba!. Edição de Maria Rita Nepomucemo.

Paulo Cannabrava é jornalista, escritor e agitador cultural.

Esse padrão de repressão foi testado nos povos originários e negros

Nós aqui no Brasil estamos vivenciando a ascensão de um movimento neo fascista que tem como uma de suas características a paramilitarização. O Rio de Janeiro é um caso urbano bastante exacerbado. Mas o campo também. Eles estão interessados em fazer milícia no campo dos proprietários de terra pra matar trabalhador e sem terra. Tem 1 Marielle Franco por dia na Colômbia. 2, 3… Esse é o modelo que eles querem implementar aqui.

Paulo Guedes aprendeu o receituário dele com o Pinochet. Querem colocar aqui a capitalização da previdência. Tentaram em 2019 e não conseguiram, mas isso está no radar. Tem uma luta no Chile, não pelo auxílio emergencial dado pelo Estado, mas pra eles poderem tirar o dinheiro deles mesmos! Da aposentadoria deles, pessoal. E os bancos não deixam. O grande capital não deixa porque pode causar desequilíbrios econômicos.

Essas formas híbridas, ideológicas, refinadas de dominação, e que a gente tem que cada vez mais estudar, para combater inclusive, elas não anulam o recurso da repressão militar, do encarceramento arbitrário, da desaparição forçada, esses velhos métodos das ditaduras militares.

Esse padrão de repressão que há nos países latino americanos é testado primeiro com os povos originários e com os negros e negras. Na Colômbia eles tem o que eles chamam de “falsos positivos”, que na verdade são pessoas do campo, gente simples, que um atravessador chega, promete um trabalho, leva pro campo e assassina a sangue frio. No Chile também é a mesma coisa. Eles pegam lutadores sociais, assassinam e simulam enfrentamentos. Como fizeram ontem no Jacarezinho. Como fazem em todas as favelas do Brasil.

Dia 8 de maio. É dia da vitória da libertação do nazi fascismo. Diante desse cenário de ascensão neofascista, de militarização que a gente vive na América Latina, cabe dizer:

Eles não são invencíveis.

Nós podemos vencê-los.

E nós vamos vencê-los.

Com unidade, unidade, mais unidade.

Vamos construir essa pátria grande.

Números da Colômbia:

936 detenções arbitrárias (desaparecidos!)

1773 casos de abuso da força pública

37 mortos

11 vítimas de violência sexual

28 atingidos nos olhos

Ideias de Francisco Prandi, com edição de Maria Rita Nepomuceno.

Nova educação: pobreza intelectual para favorecer demandas de mercado

O Brasil é a décima economia do mundo, grande mercado consumidor, mas é o segundo em concentração de renda no mundo e o sétimo em desigualdade social.

Fábio Bezerra

Em primeiro lugar quero fazer uma mensagem de solidariedade às famílias que perderem seus entes queridos nessa brutalidade passional, desumana, essa combinação monstruosa entre a pandemia e ignorância, com um governo insano, criminoso, fascista. Espero que um dia seja julgado e condenado no Tribunal de Haia e além de ser julgado nas ruas, e que seja nesse ano.

Nós chegamos no limite da paciência e no limite de qualquer valor e respeito a vida. O Brasil é hoje o epicentro da pandemia e o epicentro também da ignorância, da brutalidade na América Latina e no mundo.

É preciso situar a questão da educação e também da cultura dentro um contexto mais geral. A reforma que já está sendo implementada e na realidade já começou com Temer e é efeito do processo do golpe de 2016, a lógica neoliberal, e de dentro dessa lógica tivemos a contrarreforma trabalhista, da previdência e a famigerada emenda constitucional 95, que restringe gastos públicos com saúde, educação, que são áreas fundamentais, e a contrarreforma da educação. Também alterou a Base Nacional Comum Curricular que por sua vez remodela todas essas reformas, adequa toda sistemática da vida social brasileira à ordem do capital, a essas novas reconfigurações objetiva e subjetiva das contradições na crise capitalista com o processo da Covid, que se retroalimenta dessa crise e que passa também a ter cortes de recursos na educação e na cultura, do ponto de vista estadual e uma mudança drástica e substantiva no próprio projeto educacional em curso.

A Educação diz respeito a existência humana em toda a sua duração e seus aspectos. É um processo, ao qual a sociedade forma seus membros, mas esses membros não estão à margem de um determinado modelo social. Nós vivemos, infelizmente, num modelo capitalista que de alguma forma tem por norma formatar trabalhadores e trabalhadoras, não apenas no ponto vista técnico, ético, como também no ponto vista cognitivo e intelectual.

Uma crise avassaladora em cortes de recursos para a cultura e uma mudança drástica do processo educacional em curso, mesmo com todo esse contexto, a educação forma o indivíduo padrão, mas e ao transmitir todo um conjunto de saberes do ponto de vista de uma educação técnica que possibilita aos trabalhadores romperem com esse modelo educacional, que é uma educação que procura alijar numa cultura mais ampla na perspectiva, alterar essa realidade.

Essas contradições dialéticas da educação possibilita também um capital intelectual que auxilia a tomada de consciência crítica, da organização popular, da luta pela conquista de direitos, ele também acrescenta a perspectiva da mudança. Isso facilita as transformações. Uma educação muito perigosa às elites. Ao mesmo tempo que molda, também dá ferramentas cognitivas que possibilitam a transformação. País de tradição patriarcalista ainda muito forte arcaico do ponto de vista dessa tradição conservadora e reacionária que busca restringir e reagir as parcas conquistas que conseguimos obter com sangue, suor e lágrimas nesses últimos 40 anos, principalmente após o processo de redemocratização do país e algumas grandes conquistas como a Carta Magna de 1988.

Nós estamos vivendo um processo cultural extremamente retrógrado e reacionário. Esse processo de reformas e de ataques são subsumidos numa análise mais simplificadas, como o plano das reformas estruturais, reduzindo, os gastos do orçamento público como é necessário para essa elite totalmente desapegada de qualquer perspectiva de emancipação nacional, autônoma, independente, dos anos 40 pra cá. Esse contexto de crise fortaleceu esse setor conservador do Brasil e esse conjunto de reformas visam também o remodelamento de toda estrutura subjetiva, da formação da consciência e da subjetividade das novas gerações que virão, para uma cultura empobrecida intelectualmente. Muitos pensadores da atualidade, como Theodor Adorno aponta essa indústria cultural que ainda se faz presente, apesar de quase 100 anos depois da conceituação desse termo, cada vez mais reacionários, comerciais e cada vez mais alienantes.

O Estado não domina apenas pela repreensão policial, pelas leis, mas nos domina, sobretudo pela ideologia. Por isso, o debate é fundamental. Foram diversos os ataques, o corte de mais de 30 bilhões que o então ministro Weintraub promoveu, logo inicio de sua gestão, que atacava os institutos federais de educação. Praticamente paralisa o tripé do ensino, da pesquisa. Cerca de 95% das pesquisas não são feitas pelas instituições privadas.

Nós estamos falando de um país 220 milhões de habitantes, que é a décima economia do mundo, grande mercado consumidor, mas é o segundo em concentração de renda no mundo e o sétimo em desigualdade social. Dados da ONU.

Ciência, extensão, pesquisa e educação são instrumentos fundamentais para superar a desigualdade. Mais que o fomento é o acesso democrático do direto de todo e qualquer ser humano à educação e ao conhecimento. Paralelo a esses ataques estamos sofrendo a militarização das escolas, a escola sem partido, perseguições em retiradas de disciplina de filosofia e sociologia, o flerte e o romance para a tentativa de voltar ao passado, de apenas inserir o individuo como força de trabalho muito pulverizada, empobrecida intelectualmente para atender as demandas de mercado, em contraposição ao direito conhecimento mais rico e mais vasto.

Tramita no Congresso, o projeto de lei que chama-se Future-se, que visa retirar o papel do Estado em relação aos recursos públicos na manutenção às instituições de ensino público, estas riquezas sociais que se chamam universidades federais, Cefets. Jogando no balcão de negócios da iniciativa privada a manutenção dessas instituições vendendo sua pesquisa e seus projetos de extensão, para deixar de ser extensão para se tornarem prestação de serviços. E a médio prazo todo o conjunto educacional voltado numa perspectiva de empreendedorismo, produtivista. São muitas contradições que devem ser denunciadas. Me parece que o governo age na máxima de Maquiavel, ‘se deve fazer o mal, faça o mal de um vez só’

Ideias do professor Fábio Bezerra, com edição de Mari Weigert – jornalista.

Prof. Fábio Bezerra – Professor de Filosofia da Tecnologia no CEFET,  Mestre em Educação Profissional e tecnológica e membro do Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte e da Coordenação da Rede Tecnológica de Extensão Popular ( RETEP) e do Conselho Editorial da revista Novos Temas do Instituto Caio Prado Júnior.

Nos están matando. Que o mundo saiba!

Colombia pede socorro: “Nos están matando. Que o mundo saiba!

O apelo é feito por artistas, intelectuais e cidadãos com o objetivo de mostrar ao mundo e expor aos órgãos internacionais o que está acontecendo na Colômbia. Os Estados Gerais da Cultura solidarizam-se com os ativistas em defesa dos direitos humanos e realizam uma edição especial no sábado, às 17h, para dar visibilidade e denunciar as atrocidades cometidas por governos neoliberais e neofascistas.

A edição extra do encontro de sábado abriu uma pauta para debates sobre a situação política de governos autoritários na América Latina. É urgente que se faça algo para salvar nossos irmãos colombianos, chilenos e salvadorenhos dos ataques praticados por desmandos da extrema-direita, principalmente nos países do terceiro mundo. O debate será realizado em caráter excepcional um dia antes do tradicional encontro, desta vez o 38o. sobre Culturas Populares: Um Brasil Profundo, todos os domingos às 17h.

São convidados dos Estados Gerais da Cultura Francisco Prandi, sociólogo e mestre em Sociologia pela USP e músico. Marisol Molina, ativista e Observadora de DDHH, encarregada orgânica do partido comunista de Los Ríos y Educadora de Párvulos de Profesión e integrante da Rede Continental de Solidariedade. Judith Cartagena Ospina, poetisa e amante da liberdade. É também jornalista diretora do La Chambrana, programa que mantém um canal no Youtube, nas redes sociais, nos quais realiza o trabalho de comunicadora para o Eje Cafetero, Valle del Cauca e outras regiões da Colômbia. Sebastian Calderon, Professor Universidad Pedagogica Nacional, em Bogota. Mais a cantora e ativista dos direitos humanos, colombiana Salomé Valdés e o brasileiro Paulo Cannabrava, jornalista e agitador cultural.


Culturas populares: um Brasil profundo

Os Estados Gerais da Cultura convidam para uma conversa com agentes culturais, artistas e pesquisadores do diverso e complexo campo das culturas populares no Brasil. O encontro acontecerá no domingo, dia 9 de maio, às 17h pelo canal do Youtube e FB.

Rejane Nóbrega (PB) apresentará um breve mapa das expressões e saberes tradicionais brasileiros e um histórico das políticas públicas para o campo das culturas populares no século XXI. Joana Corrêa (MG) abordará as singularidades de linguagens e cosmologias que o campo das culturas populares abarca. Rosildo Rosário (BA) trará perspectivas de afirmações Identitárias a partir das expressões populares. E Isaac Loureiro (PA) falará sobre a importância das políticas públicas para as culturas populares e o patrimônio imaterial, e o cenário atual de destruição dessas políticas pelo governo Bolsonaro.

Durante o encontro também serão exibidos alguns vídeos que homenageiam mestras, mestres, detentores e grupos relacionados aos saberes e expressões da cultura popular.

Rejane, Joana, Rosildo e Isaac se conheceram como militantes que apoiaram a construção de políticas públicas para as culturas populares em âmbito federal durante a gestão do Ministério da Cultura de Gilberto Gil e Juca Ferreira.

Isaac Loureiro

Pesquisador e ativista das culturas populares tradicionais amazônicas, educador popular, produtor cultural, consultor técnico na área de gestão cultural, membro da Irmandade do Carimbó de S. Benedito de Santarém Novo/PA, produtor do grupo de Carimbó “Os Quentes da Madrugada”, integrante do Comitê Gestor da Salvaguarda do Carimbó, coordenador da Campanha Carimbó Patrimônio Cultural Brasileiro – movimento protagonizado pelos grupos e comunidades carimbozeiras do Pará que conquistou o registro do Carimbó como Patrimônio Imaterial Nacional. Atuou como coordenador regional na Rede Ação Griô Nacional e na Rede Nacional das Culturas Populares.

Joana Corrêa

Gestora cultural e doutora em antropologia. Foi uma das idealizadoras do Museu Vivo do Fandango, reconhecido pela Unesco como boa prática na salvaguarda de bens imateriais. Atualmente integra a equipe de gestão do Instituto Milho Verde (Serro) e atua como pesquisadora do processo de registro do Choro como patrimônio cultural brasileiro (Acamufec e CNFCP/IPHAN) É pesquisadora do núcleo de estudos Ritual e Sociabilidades Urbanas (PPGSA/UFRJ) e participa dos grupos de pesquisa acadêmica Observatório de Festas na Pandemia, Observatório de Patrimônio Cultural no Sudeste, MinasMundo e Mukuá – Laboratório sobre Vissungo.

Rejane Nóbrega

Gestora, militante e ativista cultural, pesquisadora das culturas tradicionais e populares brasileiras; arte educadora. Licenciada em Artes Visuais (FAP/PR); foi assessora de cultura da Comissão de Educação Cultura da Câmara dos Deputados; Assessora Especial da Secretaria da Cidadania e Diversidade Cultural do MinC; Assessora da Secretaria de Cultura de SP; Diretora de Cultura de Campo Largo, PR; Assessora Especial de Cultura de Conde, PB.

Rosildo Rosário

Mestre do Grupo Cultural Chegança dos Marujos Fragata Brasileira, Professor, Pedagogo, Mestre em História da África da Diáspora e dos Povos Indígenas (UFRB). Atua como professor nas redes municipais de ensino das cidades de Santo Amaro e Saubara no Recôncavo da Bahia. Atuou como mediador cultural na implementação do Plano de Salvaguarda do Samba de Roda, sendo o primeiro. Coordenador Geral da Associação dos Sambadores e Sambadeiras do Estado da Bahia. Coordenou o Processo de Patrimonialização dos Grupos de Cheganças, Marujadas e Lutas entre Mouros e Cristãos da Bahia. Atualmente é membro do Conselho Estadual de Cultura do Estado da Bahia.

A precarização do ensino é uma guerra contra as classes populares

Lucília Machado

É fundamental fortalecer essa capacidade de reflexão e de juízo crítico. Pra isso é necessário implementar projetos democráticos, inclusivos e plurais. Coisa muito distante do que o atual Ministério da Educação está providenciando

O atual contexto brasileiro é muito adverso à educação, à cultura, à ciência e ao conhecimento. É um contexto que conta com a co-participação e a cumplicidade do Ministério da Educação e com a negligência dos impactos negativos da pandemia da COVID-19 sobre a educação brasileira. Haja visto a negação para comprar os laptops, instalar as internets para que os alunos brasileiros pudessem acompanhar a escolarização nesse período de recolhimento.

A origem desse quadro é uma ofensiva ultraconservadora, da chamada “guerra cultural”, de que faz parte o movimento chamado “escola sem partido”. E há um falatório sobre o mal desempenho dos alunos das escolas públicas que legitima a intromissão das Fundações e Institutos ligados a bancos e empresas com seus pacotes educacionais visando o que eles chamam de “melhorar a educação brasileira”.

A política desse movimento é de negação da ciência, das artes e da cultura. É um discurso agressivo a tudo o que a ultradireita diz ser “doutrinação ideológica”, tudo o que ela interpreta como “ideologia de gênero”, “marxismo cultural”, “globalismo”… Hostilidades contra segmentos da população por conta das suas identidades de gênero, religiosa. Ataque aos direitos humanos. Intimidações milicianas, incluindo violências físicas contra opositores, perseguição aos estudantes, aos professores.

Recentemente o próprio ministro da educação disse que hoje nós temos estudantes brasileiros que com 9 anos de idade não sabem ler mas eles sabem colocar uma camisinha. Isso não é de forma alguma uma forma de um ministro da educação se colocar. É um vexame. Além de ser um desrespeito com as nossas crianças. É uma pregação cuja intenção é de fato solapar a confiança na escola, suas relações internas e também externas, com os pais e a comunidade, para implantar o que eles acham que é certo, que é a chamada ‘home schooling’, que é a escola familiar.

A reforma do ensino médio é um exemplo da simplificação da educação, em que sociologia e filosofia foram sacrificadas em termos de carga horária.  No que se refere à política nacional de livros didáticos, o que a gente está assistindo é a censura. As editoras estão sendo compradas por grandes corporações em conluio com essa política. É uma articulação em nível mundial, não é só aqui no Brasil, nós apenas estamos dentro desse contexto. Atrás do Ministério da Educação tem as investidas de empresários, políticos, militares, especialistas articulados por gabinetes estratégicos como o chamado “gabinete do ódio”.

O que esse pessoal todo tem em comum? Uma reação aos poucos avanços educacionais que foram alcançados pela sociedade brasileira nas últimas duas décadas, e a defesa dos privilégios de uma minoria que quer a todo custo manter as camadas populares sem acesso ao conhecimento.

Lembram o que Paulo Guedes disse quando o dólar estava a R$1,80? “Ah, uma festa danada! Empregada viajando pra Disneylandia”. Lembram quando ele disse: “atualmente as pessoas estão vivendo até os 100 anos, o Estado não dá conta de arcar isso”? E com relação ao FIES – Fundo de Investimento ao Estudante do Ensino Superior – o que ele disse “que filho de porteiro está entrando na faculdade”.

É um poder político reacionário sustentado pelo capital transnacional que mobiliza as velhas classes médias, temerosas da mobilidade social das camadas populares. Mobiliza também setores privilegiados dos trabalhadores, principalmente masculino e branco, que não querem perder seus espaços no mercado de trabalho. É uma cultura neofascista, caracterizada pela ideia de supremacia racial e/ou cultural, xenofobia, homofobia, intolerância religiosa, ataque também aos povos originários… É realmente a banalização da violência, simbólica e com fascínio pela dominação.

A educação é atingida por esses valores. Nós democratas aprendemos e a crer e a defender que o estado deve prover aos cidadãos os seus direitos sociais e que todo direito social é uma classe dos direitos humanos. Tá lá na Declaração Universal que foi promulgada pela ONU em 1948.  Só que a realidade brasileira de hoje, e mesmo a mundial, tem se mostrado contrária à efetivação desses pressupostos.

A PL 5595/20 que considera a educação como atividade essencial, a educação presencial, intimando portanto a volta às aulas, sem condições sanitárias que garantam a segurança da saúde das pessoas. Esse entendimento da educação como uma atividade essencial tá relacionado com o fato da Organização Mundial do Comércio ter definido a educação como um gênero de serviço: uma mercadoria, assim como agora tudo tá virando mercadoria. E o aluno passou a ser o quê? Um cliente. Enquanto os cursos ministrados são tratados como produtos que têm que estar em sintonia com as demandas do mercado. Uma lógica que atende ao interesse do setor privado e as fundações, institutos, editoras, que se colocam como tutoras das escolas públicas, estão tomando a educação como atividade essencial dentro de um sentido ligado a esses interesses mercantis. E essa palavra “essencial” vem como um ardil pra impor esses interesses dominantes.

E a motivação disso não é considerar a educação como atividade essencial tal qual nós pensamos a essencialidade dela. É lógico que a gente entende que a COVID-19 está trazendo um enorme prejuízo pras nossas crianças e jovens em relação à educação, só que essa PL 5595 quer reativar a economia a todo custo para quê? Para fazer circular as mercadorias e continuar a máquina da produção dos lucros.

O Ministério da Educação promove regressões e constrangimentos aos educadores, estudantes e escolas em geral, restaurando concepções arcaicas e irracionais mesmo no plano das ciências da natureza, como uma forma de banalizar a ignorância. Tudo no sentido de conformar os alunos a serem consumidores dispostos a colaborar com esse reinado do mercado.

Há um trecho do livro do Lukács “Introdução a uma estética marxista” em que ele narra os apaixonados conflitos em torno da teoria de Copérnico que levaram Giordano Bruno à fogueira e Galileu à inquisição. Se a  ciência deve ou não ter o direito de investigar sem preconceito todas as coisas, mesmo que os seus resultados não concordem com os dogmas da religião – são  discussões ideológicas entre o feudalismo caduco e a burguesia ascendente. Atualmente é semelhante ao que Lukàcs coloca.

São processos que se mostram necessários para responder ao aprofundamento da crise capitalista em esfera mundial. Estamos vivendo situações limites em que essas agressões também se estendem ao planeta: o desmatamento, os efeitos nocivos de monoculturas, a problemática das guerras… E nesse contexto grave vem os problemas do mundo do trabalho com a reforma trabalhista de 2017, a produção do desemprego com o sentido perverso de fazer com que os trabalhadores se submetam a condições precaríssimas de trabalho e a não reagirem à liquidação da legislação protetora do trabalho. Então toda a sociedade entra em crise. O trabalho entra em crise. Então tudo isso faz o quê? A educação entrar em crise, a cultura entrar em crise, o direito ao conhecimento entrar em crise.

Porque a educação pressupõe uma relação muito próxima com o mundo do trabalho: “formar” as pessoas. Como é que a gente forma os jovens para esse contexto? A crise social fortalece essa política anti-cultura, anti-educação, do Ministério da Educação. Para esses trabalhadores basta fornecer saberes utilitários descartáveis, apoiados em evidências rotineiras, adaptados para contexto tecnológicos muito delimitados, e de rápida obsolescência. A precarização do ensino é acompanhada pela expansão do ensino à distância. Com isso as grandes firmas de tecnologia podem obter seus lucros e o estado também poupa porque pode dispensar uma série de professores. Os conteúdos são alvo. As humanidades são as mais prejudicadas. Mas as ciências da natureza também são atingidas.

A questão do currículo também está dentro de um contexto em que é preciso para o neofascismo destruir formas críticas de pensar, e fazer com que o ensino e aprendizagem da massa dos alunos das camadas populares seja o ensino da ignorância, a diminuição da  qualidade civilizatória das gerações, a destruição da escola é que está em jogo e de todas as formas possíveis.

O direito à cultura e à educação é fundamental para priorizar a resistência a essa destruição social.  Educar por meio do juízo crítico. Oferecer bases científicas sólidas, capacidade argumentativa, enfim desenvolver a capacidade da resistência intelectual às manipulações midiáticas. O exemplo das fake news é cabal. As pessoas são manipuladas por essas estratégias. É fundamental fortalecer essa capacidade de reflexão e de juízo crítico. Pra isso é necessário implementar projetos democráticos, inclusivos e plurais. Coisa muito distante do que o atual Ministério da Educação está providenciando. Enquanto protegem um determinado setor educacional destinado a formar elites científicas, técnicas, gestionárias, onde os filhos dos porteiros, das empregadas domésticas, e dos trabalhadores em geral, não podem entrar.

Está muito evidente a estratégia de rebaixar moralmente todos os que ensinam. A ideia deles é reeducar os professores pois os professores precisam aprender a trabalhar de outro modo. Militarizar as escolas. Fazer as parcerias com os empresários. Ao lado do corte de orçamento, que agora se tornou muito mais forte. É um projeto. Um projeto de política educacional de liquidação do direito ao conhecimento para a produção de pessoas com conhecimentos precários. É uma guerra contra as classes populares.

Edição/resumo feito por Maria Rita Nepomuceno sobre o depoimento da Prof. Lucília Machado, durante o encontro ‘O direito ao conhecimento e a anticultura no Ministério da Educação’. Maria Rita atua na área de criação e curadoria em audiovisual e apoia os Estados Gerais da Cultura.

 Lucília Machado é pós-doutora em Sociologia do Trabalho, doutora e mestre em Educação, graduada em Ciências Sociais, é professora titular aposentada da UFMG.